Ano VII

O Lar das Crianças…

domingo out 16, 2016

peculiar

O Lar das Crianças Peculiares (Miss Peregrine´s Home For Peculiar Children, 2016), de Tim Burton

O que faz de O Lar das Crianças Peculiares melhor do que os recentes filmes que Tim Burton despeja no mercado, produzidos quase que mecanicamente? (Burton Mãos de Tesoura: basta um arbusto, ou seja, um motivo dentro do universo de interesses do diretor, e logo surgem uma galeria de figuras, ou filmes, todas relativamente parecidas entre si; depois de uma primeira olhadela pela galeria de galhos esculpidos, encontra-se alguma graça; na segunda, o truque mostra que “pintar” navios com grãos de areia coloridos dentro de garrafas é só isso mesmo, um truque; que Burton, no fim das contas, jamais filmou a morte e a escuridão). Desta vez, o diretor teve às mãos-artesãs um material com uma série de elementos-chave que estão fora do seu inventário habitual. Há o senso de grupo, as viagens no tempo, os super-poderes, um bestiário menos lúdico e mais funcional, ou seja, que realmente oferece perigo aos personagens, por exemplo.

Mesmo visualmente parece haver influências “de fora”: difícil não lembrar de X-Men, Harry Potter e de Resident Evil (na caracterização dos monstros, em específico). Essa “contaminação” parece dar ao diretor um ímpeto maior em realizar bem aquilo que é considerada sua marca. Eva Green, como a personagem forte, mãe de todos, atua com uma austeridade um tanto brincalhona, acrescentando o grau certo de esquisitice à mulher, sem lhe transformá-la em um boneco de cera ou alguém fantasiado de cadáver, como é comum quando Burton filma Helena Bonham Carter. Há também um esmero maior nas composições visuais, ou nos momentos de abstração-soft, como na sequência do mergulho e na bela pequena passagem em que Emma é levada por uma corda, tal um balão. As sequências de ação também são tratadas com cuidado, como se pode perceber na batalha entre os monstros e esqueletos no parque de diversões (cena que também parece uma resposta à “contaminação” pela inevitável batalha épica envolvendo diversos personagens e seres gigantes, presentes em qualquer filme de herói: ao invés de vermos corpos que parecem inquebráveis deixando as cidades com aspecto pós-bombardeio durante a guerra, em que dos prédios sobram apenas as estruturas, assistimos esqueletos vencendo os monstros, e as vezes sendo desmontados, é certo, mas, de qualquer modo, trata-se da vingança da estrutura!).

O Lar das Crianças Peculiares possibilita outra “contaminação”, bastante interessante e que, embora não estivesse ausente de outras obras de Burton, aparece aqui de maneira bem mais pungente: a contaminação com o mundo real, na clara analogia que o filme faz com a perseguição nazista aos judeus e àqueles aos quais o regime achava “diferente”. O real dá uma certa cor à habitual palidez do corpus de Burton.

Wellington Sari

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Tim Burton na Interlúdio:

Grandes Olhos

Sombras da Noite

Frankenweenie

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