Ano VII

Triunfo

terça-feira abr 8, 2014

Triunfo (2014) de Caue Angeli e Hernani Ramos

Tal como em Ai Weiwei – O caso falso, Triunfo busca a representação de uma figura artística de resistência. No lugar de Weiwei, o pernambucano Nelson Triunfo, precursor do hip hop no Brasil; no lugar do registro de um momento excepcional na vida do artista, o já consagrado modelo das biografias, tão em voga no cinema brasileiro recente, principalmente no que tange o mundo da música. Da mesma forma que o filme sobre Weiwei o filme sobre Triunfo vive um impasse, talvez ainda mais acentuado, no que diz respeito ao descompasso entre a força do artista retratado e a forma escolhida para se captar e fazer ecoar tal força.

De início, a praga do formato “biografia-musical” já se mostra como castradora de qualquer força que ouse emanar do filme. A importação desse modelo televisivo, de forma massiva no cinema brasileiro recente, já nos presenteou com inúmeras pérolas que, ao apostarem na força do assunto, se afundam numa mesquinha e preguiçosa fórmula, que acaba por transformar o filme numa espécie de fast-food da cultura: saiba todos os lados, todas as questões envolvidas, todas as fases de determinado artista ou movimento, mas saia indiferente da sala do cinema. Qualquer inquietação estético-política contida na expressão inicial do retratado se encontra recalcada por uma forma que se escora na mentirosa ideia de popularização, seu velho álibi.

Em um dos momentos mais fortes do filme vemos uma imagem de arquivo, inalterada, intacta, na qual um grupo de jovens negros dança em uma roda num baile black. Dali emana toda sua força, simbólica e concreta, contida nos movimentos coreografados daqueles corpos, imbuídos de reivindicações existenciais e políticas – algo de uma força bruta, que dificilmente se repetirá ao longo do filme. Novamente (tal como no filme sobre Weiwei), são momentos de exceção, rompantes isolados. Triunfo busca, pelo contrário, uma representação calcada muito mais no imaginário que a indústria cultural construiu ao longo de todos esses anos sobre hip hop do que qualquer força originária que reverberasse questões políticas sérias que estavam em jogo naquele momento.

As imagens aqui evocam e se fazem presentes muito mais no campo da publicidade (todo o esquema de cenas feitas para interligar a narração do filme remete claramente ao imaginário que a publicidade criou ao redor do hip hop) do que ao campo desses registros de material de arquivo, de rara força e beleza – perdeu-se a coragem para deixar esses materiais ecoarem, vibrarem, enfim, falarem para o nosso tempo, algo muito diferente do que acontece, por exemplo, em The black power mixtape, filme de abertura do É tudo verdade em 2011.

Guilherme Savioli

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