Ano VII

Um Castelo na Itália

sexta-feira nov 22, 2013

Um Castelo na Itália (Un Château en Italie, 2012), de Valeria Bruni Tedeschi.

Um castelo na Itália, de Valeria Bruni Tedeschi, trata basicamente de uma quarentona, solteira (interpretada pela própria diretora) que precisa lidar com a necessidade da família em se desfazer de um castelo que possui, ao mesmo tempo em que se envolve com um rapaz bem mais jovem que ela. À primeira vista, a história que envolve uma família às voltas com a necessidade de se desfazer de seu patrimônio para sanar dívidas, poderia sugerir uma aproximação da trama com a recente crise europeia. Tal ideia parece impor ao filme de Tedeschi um peso, uma obrigação, uma pressão a qual ele de longe não se submete. Contudo, o tom a priori leve e descompromissado almejado está longe de ser uma qualidade: Tedeschi refaz o mesmo filme pela terceira vez seguida, reforçando seus estilemas na ânsia de afirmar um suposto estilo como diretora. 

Assim como em seus filmes anteriores – É mais fácil um camelo… (2003) e Atrizes (2007) – as cenas são regidas por uma espécie de esquizofrenia. A personagem atrapalhada e acanhada está sempre com dificuldade de lidar com as situações, gerando uma espécie de acúmulo de energia a ser descarregado (vide a cena em que ela irrompe um bloqueio de freiras para sentar na cadeira sagrada, que supostamente ajuda mulheres a engravidar). Em geral, nada se conclui e as situações são interrompidas por um mal estar desconcertante, uma vontade de exigir do mundo desinteressante e das personagens desinteressantes que ela filma um tragicômico “chique”, revestido sempre de uma suposta auto-ironia.

Isso porque o que predomina na ideia de mise en scène de Tedeschi, é um suposto estrangulamento de sua protagonista por uma força de constrangimento, um desarranjo do corpo na situação social em que habita – é daí que supostamente viria seu tom tragicômico e sua dose de auto-ironia. Esse desarranjo do corpo no espaço social é usual no gênero cômico e talvez seu exemplo mais clichê – e ao mesmo tempo mais genial – seja o próprio Chaplin.

A questão é que Tedeschi não está interessada que esse desarranjo se manifeste como uma interação entre o “eu” e o “mundo”. Tampouco está interessada no reconhecimento de uma alteridade, que mesmo sendo opressora, existe, está ali, é reconhecida enquanto tal, e que através dessa inevitabilidade e desse corpo desajeitado, mas resistente, surja o lampejo tragicômico almejado. Seu cinema está calcado numa ideia de clausura em relação ao mundo. Constrói-se um casulo para sua protagonista-autora brincar de desajeitada, reforçar seu ego através de uma abordagem autobiográfica e desfilar uma vontade de auto-ironia que de engraçado nada possui.

Aliás, essa vontade de auto-ironia (que no fundo soa mais como um grito desesperado de afirmação de um “eu” mimado e egocêntrico), aliada ao absurdo em forçar uma correlação da trama com o cenário da crise europeia, parece reafirmar algo já apontado por Serge Daney: a feitura de filmes somente pela vontade de ser cineasta ao menos uma vez vida. O riso constrangido da protagonista Louise, recorrente nas situações pelas quais ela passa ao longo do filme, é emblemático nesse sentido: um riso dela, para ela e que diz somente respeito ao seu mundo e suas angústias particulares. Tedeschi, munida de seus mesmos estilemas, refaz o mesmo filme pela terceira vez seguida, pois quer ser cineasta ao menos uma vez na vida. 

Guilherme Savioli

© 2016 Revista Interlúdio - Todos os direitos reservados - contato@revistainterludio.com.br