Ano VII

Febre do Rato

sábado jun 23, 2012

Febre do Rato (2011), de Claudio Assis

Cláudio Assis e os seus tipos marginais retornam diferentes. Agora temos a fotografia P&B de grife de Walter Carvalho, que demora alguns minutos a deixar de incomodar o nosso olhar. Seja pela artificialidade das imagens ou a desconfiança que tal artifício traz. De resto, o mesmo discurso virulento e com muito pouco resultado prático dos seus longas anteriores. Assis tem enorme prazer em jogar o espectador dentro de um pseudo mundo-cão, habitados por figuras caricaturais que se acham mais contestadoras e corajosas do que realmente são. É o chamado chocar por chocar, mas sem a honestidade cafajeste do cinema de exploração. E Assis consegue ganhar a atenção de quem se acostumou com o puritano cinema nacional das últimas décadas ou nunca se aventurou em nenhuma modalidade do cinema extremo. Os filmes de Assis são caretas porque seus personagens não tem vida própria longe de suas perversões e idiossincrasias, parecem existir somente no tempo da projeção e depois somem, sem deixar muitos vestígios. São menores do que suas manias, que por sua vez também não justificam todo o estardalhaço em torno delas. Como Jonas Bloch em Amarelo Manga, cuja tara misteriosa era (horror, horror) atirar em cadáveres.

Há que se admitir, em Febre do Rato temos um avanço significativo. A fauna concebida por Assis agora não está espalhada, e se mostra capaz de formar um núcleo. Todo ele em torno do poeta maldito Zizo, uma das figurinhas recorrentes da sétima arte brazuca. Ele contesta, repudia, grita bem alto, tira a roupa, mas não consegue comer a mocinha no final. No máximo ele vai satisfazer os prazeres da carne com mulheres bem mais velhas, ali mesmo no quintal de casa dentro de uma tina de água. Porque é contestador, reflete a revolta deste artista, além de causar admiração e repulsa nos jurados dos festivais. Os que transitam em torno de Zizo, fazem isso mais por falta de opção ou talvez queiram farrear apenas. Diferente do personagem de Matheus Nachtergaele que passa o filme todo incomodado, pensando em uma suposta traição de sua namorada, um travesti, mas que também pouco ou nada importará pois até parece existir em outro tempo, longe do universo que habita dentro do umbigo de Zizo. A gracinha Nanda Costa, na pele de Eneida, vai dar um gelo neste poeta (que adora pegar velhas, mas que caiu nos encantos dela). Vai atiçar o coitado e depois manter distância, já que o artista só existe se estiver em conflito.

A beleza natural de Nanda Costa é o grande predicado de Febre do Rato. Prestes a se tornar a mais nova namoradinha da Rede Globo, Nanda pode ter tido aqui seu grande momento de musa. Pena que no final do filme resolva virar a casaca e entrar na onda do poeta. Mas Cláudio Assis tem outro ás na manga. Suas criações existem num mundo próprio, longe desta realidade careta nossa. Por serem livres, elas precisam ser enquadradas, postas em seu lugar. É quando os homens, os gambés, a força opressora entra em cena. Pobre poeta. Só pode existir se estiver em conflito. Mas não pode comer a mocinha. Assis precisa dar seu recado e o filme terminar. Para o nosso bem.

Leandro Cesar Caraça

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Texto de Cesar Zamberlan sobre Febre do Rato

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