Ano VII

Paraísos Artificiais

quarta-feira mai 9, 2012

Paraísos Artificiais (2012), de Marcos Prado

Paraísos Artificiais, o primeiro longa de ficção de Marcos “Estamira” Prado, simula a experiência de uma rave. Da expectativa com a festa movida a música eletrônica e da abertura para descobrir novas drogas e sensações à constatação final de que algo se perdeu no processo, temos espelhada na narrativa do filme a experiência de participar de um evento desses, com forte teor de música eletrônica e uma noção de que “ninguém é de ninguém”. Está tudo ali, flagrado de maneira não linear por uma câmera mais esperta do que atenta.

A impressão geral é a de termos visto um gigantesco comercial de energético com inserções de “aprenda a falar inglês em Amsterdan” e um flashback final no Rio de Janeiro que acerta uma pequena parte das pendências do filme (infelizmente, só no que diz respeito à trama, nunca do ponto de vista cinematográfico). Frases como “Uau, isto aqui está demais”, ou “nossa, que experiência incrível” (não exatamente assim, mas com o mesmo teor), que ouvimos a todo momento (como numa propaganda), reforçam seu lado propagandístico: de um estado de espírito, de um bem estar que é punido, de um fazer cinema festivo e doente.

Isso posto, é necessário destacar que Nathalia Dill, a atriz principal, demonstra certo talento. Não só porque tem uma beleza incomum, mas também porque veste-se muito bem no papel de DJ de sucesso, uma jovem que flertou com o espírito rave mantendo-se deslocada de sua parte mais promíscua e perigosa. Disseram-me que faz parte da novela das nove. Sinal de que pode aparecer algo que preste ainda nesse espaço global.

É a história dela que acompanhamos com certo interesse no filme. Ela e sua alma gêmea, uma amiga inseparável com quem tem momentos de paixão carnal e ternura, vão para uma rave numa praia paradisíaca do nordeste brasileiro. Lá experimentam novas drogas, conhecem tipos místicos e dividem sexualmente um playboy, só pela experiência de dividirem algo intenso. As coisas não vão sair nada bem, sabemos desde o princípio, e o que nos resta acompanhar é o caminho de volta desses personagens perdidos, todos merecedores de alguma redenção, exceto a amiga amante, que precisou ser sacrificada pela trama – algo que o filme só mostra depois de uma hora de projeção, mas que já tinhamos percebido antes, graças a alguns sinais.

Em relação à narrativa, a pergunta que se impõe é: para que filmar tudo fora da ordem cronológica? O cinema contemporâneo herdou o pior do cinema moderno, essa mania de propiciar ao espectador uma experiência semelhante à da revisão, já na primeira visão de um filme. Dessa forma, dá-lhe pistas e mais pistas do que vai acontecer (e do que já aconteceu), para que o espectador sinta-se inteligente ao montar um simples quebra-cabeça.

O drama desses personagens seria muito forte caso se optasse pela ordem cronológica. Ainda mais porque os atores, quando não são bons, ao menos não comprometem. Infelizmente, prefere-se sempre os jogos de inteligência, de habilidade mais que duvidosa, a coisas simples e desprezadas como construção dramática; a confusão aparente à simplicidade transparente, o preguiçoso embaralhar de tempos à linearidade que reforça as emoções. Pobre dramaturgia.

Sérgio Alpendre

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