Ano VII

Rio – Dia 11

quinta-feira out 15, 2015

DIÁRIO DO FESTIVAL DO RIO

DIA 11 – SEGUNDA-FEIRA – 12/10, por Gilberto Silva Jr. 

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O PESO DO SILÊNCIO (The Look of Silence), de Joshua Oppenheimer e anônimo (Dinamarca / Finlândia / Indonésia / Noruega / Reino Unido, 2014)

O Ato de Matar (2012), pelo visto, não esgotou em seus 159 minutos de projeção o projeto de Joshua Oppenheimer em retratar e refletir, entre outras coisas, sobre a tal “banalidade do mal” discutida nos textos de Hannah Arendt. Uma vez que o termo “perturbador” acaba sendo bastante limitado para definir o efeito causado por O Ato de Matar, essa dificuldade em encontrar um conceito que explique esse efeito acaba por se ampliar após assistirmos a O Peso do Silêncio. Depois de centrar sua câmera nos perpetradores de um sangrento massacre oposicionista que se seguiu a um golpe de estado em 1965 na Indonésia, o cineasta volta agora sua atenção para o lado oposto: a família de um jovem assassinado durante as perseguições. Ao confrontar o irmão da vítima aos algozes, é a partir do rosto que acompanha, em enigmático rancor, as recordações dos assassinos que ressurge aquela sensação indefinível à qual nos referimos. O confronto a uma crueldade inerente ao ser humano, razão de ser do projeto de Oppenheimer, e resumida pelas expressões do rosto de Adi, gera emoções de rara transcendência, fazendo este projeto assumir sua máxima amplitude.  Emoções tais que podem ainda ser potencializadas pela constatação que nossa realidade histórica local não se faz muito distante daquela apresentada pelos documentários em questão.

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A RUA DA AMARGURA (La Calle de la Amargura), de Arturo Ripstein (México / Espanha, 2015)

Duas prostitutas velhas e miseráveis. Dois anões, mascotes de luta livre. Um crime tirado de manchetes de tabloides sensacionalistas. É com estes ingredientes, coerentes com um universo que lhe serviu de matriz durante toda a carreira, que Arturo Ripstein consegue nos trazer, finalmente, aquece grande filme, à altura de seu talento, que vinha nos devendo há mais de uma década. Seus últimos trabalhos exibidos por aqui em festivais, A Virgem da Luxúria (2002) e O Carnaval de Sodoma (2006), ficaram marcados por excessos narrativos e estéticos, que os situavam à beira de delírios barrocos. Em A Rua da Amargura, sem abrir mão dos planos-sequência elaborados que são sua marca registrada, Ripstein retorna com a devida crueza e o devido sentimento ao universo da sordidez e da pobreza degradante, retratando personagens complexos, capazes de agir concomitantemente com uma delicada humanidade aliada a uma animalidade que beira o irracional. As emoções extremas de seus personagens, todas dignas de letras de bolero, são pontuadas por uma fotografia em preto-e-branco, ao estilo do cinema noir, que acentua um cotidiano de humilhações nos cortiços, becos e alquebrados ringues de luta por onde se passa a ação. Contando com diálogos inspiradíssimos de sua roteirista Paz Alicia Garciadiego, Ripstein faz de A Rua da Amargura uma pintura suja e borrada da indescritível tristeza da existência, ao mesmo tempo desagradável e comovente.

 

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