Ano VII

Rio – Dia 9

segunda-feira out 12, 2015

DIÁRIO DO FESTIVAL DO RIO

DIA 9 – SÁBADO – 10/10, por Gilberto Silva Jr.  

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TRIBUNAL (Court), de Chaitanya Tamhane (India, 2014)

O diretor estréia na ficção explorando os meandros do moroso e contraditório sistema judiciário de seu país. A prisão de um ativista e cantor de protesto sob a acusação de uma de suas performances ter estimulado um suicídio gera um processo de conotações “kafkianas”. Tamhane usa de uma narrativa que beira o documental para observar e criticar os aparelhos estatais indianos de repressão. Se as cenas de tribunal e as encenações das apresentações de cantor, conduzidas em estilo bastante realista, geram interesse e cumprem as intenções propostas, a opção do diretor-roteirista em acompanhar momentos da vida dos demais envolvidos no processo (advogado de defesa, promotora e juiz) nem sempre funciona, pulverizando por demais a ação e diluindo sua denúncia em favor de uma crônica cotidiana pouco coesa.

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OS IRMÃOS LOBO (The Wolfpack), de Crystal Moselle (EUA, 2015)

Moselle concebe, segundo sua proposta de descortinar o universo de uma família muito peculiar, um documentário de momentos fascinantes, ainda que um tanto irregular, e bastante assustador. Os irmãos Angulo foram criados em isolamento num apartamento de Nova York, tendo como principal contato com o mundo exterior os filmes assistidos pela tv, vhs ou dvd. A cineasta registra esse cotidiano, deixando muitos pontos essenciais sem maior esclarecimento e explora o momento em que a saída para o mundo torna-se irreversível. O registro das reproduções dos filmes vistos pelos garotos são os momentos mais interessantes e Moselle, com isso, parece querer afirmar o poder do cinema em manter um pouco da sanidade quando não restam muitas opções de escape. Por outro lado, o assustador advém de um tipo de deslocamento em sentido inverso feito pelo espectador cinéfilo quando, em especial nessa época de festivais, optamos por nos recolher do mundo, permanecendo numa sala escura em companhia dos filmes.

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NÃO É UM FILME CASEIRO (No Home Movie), de Chantal Ackerman (Bélgica / França, 2015)

Não resta dúvida que o suicídio da diretora Chantal Ackerman no último dia 4 de outubro altera sobremaneira a percepção deste seu derradeiro trabalho. Se o filme acompanha momentos finais da vida de sua mãe, este instante após a morte da autora torna tais imagens um registro da aproximação com seu próprio final. Não há dúvidas que Ackerman, ao captar a mãe, seu cotidiano e suas histórias, o faz como forma de refletir sobre si mesma, nos tornando testemunhas de um processo de constante inadequação aos ambientes que a cercam. Ackerman parece nunca estar integrada ou à vontade com seu entorno, seja nos registros no lar materno, seja nas constantes viagens em função de seu ofício que registra de maneira subjetiva. Se uma análise crítica com mais frieza poderia caracterizar Não é Um Filme Caseiro como um trabalho redundante e auto-centrado, a constatação da trágica opção tomada por Chantal nos leva a afastar-nos, ao menos momentaneamente, de nosso poder de julgar o resultado final de uma obra, em favor de refletir em maior profundidade sobre as intenções e a essência de seu processo de realização.

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A BELA ESTAÇÃO (La Belle Saison), de Catherine Corsini (França, 2015)

Catherine Corsini pode até tentar vender este novo filme como uma peça de militância LGTBS, mas a verdade é que A Bela Estação é, em forma e conteúdo, um dramalhão bastante convencional. O maior mérito do filme está na absorção dos ambientes e do momento histórico onde se passam a trama, e nos contrastes entre a França rural e a Paris efervescente em transformações culturais do início dos anos 1970. No mais, temos a eterna história de amor, no caso entre duas mulheres, uma jovem fazendeira e uma intelectual parisiense mais madura, indo de confronto às repressões que a sociedade proporciona. Corsini segue sem imaginação a cartilha básica do novelão, com direito a despedida em estação de trem quase no final, apimentando seu material com sexo e nudez das belas atrizes. Esquecível e desnecessário, exceto pela potente atuação da atriz e também cineasta Noémie Lvovski.

 

 

 

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