Ano VII

Rebeldes do Deus Neon

quarta-feira mai 21, 2014

Rebeldes do Deus Neon (Qing Shao Nian Nuo Zha, 1993)

O primeiro longa de Tsai Ming-liang pouco se assemelha na forma aos seus outros filmes. Rebeldes do Deus Neon não traz longas tomadas: sua montagem mostra-se dinâmica se comparada com obras posteriores. A câmera também se movimenta mais, bem de acordo com o tema central do filme, que é a delinquência juvenil. Já presentes aqui, por outro lado, estão o elemento água usado de maneira metafórica, a solidão das personagens e a presença do ator Lee Kang-sheng – marcas posteriores encontradas na filmografia de Ming-liang.

Em Rebeldes do Deus Neon, que se passa na cidade de Taipei, o adolescente Hsiao-Kang (Lee Kang-sheng) não compartilha das crenças de sua mãe de que ele possa ser a reencarnação de um deus raivoso. Paralelamente, o também jovem Ah-tze (Chen Chao-jung), junto ao amigo Ah-ping (Jen Chang-bin), comete pequenos furtos. Junta-se aos dois a jovem Ah Kuei (Yu-Wen Wang), que trabalha em um ringue de patinação e começa uma relação com Ah-tze.

A falta de comunicação com os pais leva Hsiao-Kang a fugir de casa, e ele começa a seguir o casal: Ah-Huei, porque danificou o táxi de seu pai; Ah-tze, porque Hsiao-Kang se apaixonou por ela.

Incapazes (ainda que desejosos) de sair de Taipei ou de voltar para as casas de onde saíram, os jovens marginais sem rumo de Ming-liang vagarão perdidos em meio aos cenários luminosos das ruas movimentadas, dos ringues de patinação e de uma casa de fliperamas que têm ponto de referência (e com a pulsante trilha- sonora pontuando).

Na estreia de Ming-liang, nota-se um estilo ancorado em nobre casta de cineastas. Da alienação urbana de Antonioni, da doçura com os jovens marginais típica de Fassbinder ou mesmo nos pequenos toques de humor herdados das gags cinema mudo (como quando Hsiao-Kang quebra o vidro da janela ao tentar espantar um inseto), a verve cinéfila de Ming-liang se faz presente como uma carta de princípios.

Ao término do filme, a câmera aponta para o céu, despedindo-se da cidade, coisa que os rebeldes do neon não conseguiram fazer. Feita então a confrontação com seus guias espirituais no cinema, Ming-liang irá agora se lançar a voos maiores. O rito de passagem foi completado já neste primeiro filme, pequeno e belo.

Leandro Cesar Caraça

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