Ano VII

Eu Não Quero Dormir Sozinho

segunda-feira mai 19, 2014

Eu Não Quero Dormir Sozinho (Hei Yan Quan, 2006), de Tsai Ming-liang

Se a ideia-chave para pensarmos Eu Não Quero Dormir Sozinho é “acolhimento”, um objeto torna-se indispensável no contexto do filme: o colchão surrado que o trabalhador malaio pega na rua.

O que melhor representaria o acolhimento senão o colchão no qual nos deitamos ao nos despirmos do controle (racionalização e consciência) e mergulharmos no indefinido (sonho e inconsciência)? É o colchão velho que acolhe o trabalhador malaio, mas que também receberá o corpo machucado de Hsiao-Kang.

Num lugar em que um fumaceiro põe em risco o próprio ato de respirar (obrigando o uso de máscaras, ou seja, afastando ainda mais as bocas dos beijos), os três personagens de Eu Não Quero Dormir Sozinho (trabalhador, garçonete e Hsiao-Kang) buscam acolhimento no mais acolhedor dos lugares: uma volta ao útero.

Numa filmografia como a de Tsai, na qual não raro são poucos os espaços de esperança (o que dizer do choro histérico que encerra Vive L'Amour?), o plano final do trio deitado no colchão que flutua no aguaceiro do prédio (que entra como metáfora justamente do útero) é uma calorosa defesa do acolhimento como contraponto à solidão lá do mundo.

Heitor Augusto

© 2016 Revista Interlúdio - Todos os direitos reservados - contato@revistainterludio.com.br