Ano VII

O Congresso Futurista

segunda-feira abr 14, 2014

O Congresso Futurista (The Congress, 2013), de Ari Folman

O diretor israelense Ari Folman foi revelado ao mundo com Valsa com Bashir, animação de cunho político sobre a invasão do Líbano pelo exército de Israel em 1982. É o mesmo assunto de um dos filmes mais incisivos de Amos Gitai, Diário de Companha, feito no calor da hora, em 1982, sem o distanciamento histórico da animação de Folman.

O Congresso Futurista é também um filme político, ainda que seja necessário incluir um "de certa forma" a essa afirmação. A mistura de live action com animação de traços semelhantes ao de Valsa com Bashir serve apenas para reiterar: o mundo da animação é superior. Em tempos de realidade sórdida, melhor ficar com a imaginação que liberta cores e contornos particulares, não submetidos a uma ordem da natureza.

A afirmação, logicamente, pode ser negada pelos projetos futuros de Ari Folman. Ele pode ser contratado novamente, ou indicado por Harvey Keitel ou Robin Wright, os astros da parte live action, que ocupa quase toda a primeira metade de O Congresso Futurista.

Dessa divisão resulta um filme estranho, um tanto esquemático na exploração do caminho mais aterrorizante da tecnologia (quão malucas são aquelas fotografias tiradas das expressões de Robin Wright, e que ideia é essa de colocar Keitel para contar histórias e controlar as emoções dela?), e certamente falho em promover uma leitura política mais aprofundada.

A subtrama do filho com problema de visão remete ao Wenders de Até o Fim do Mundo em mais de um sentido. Como Wenders, Folman praticamente mete os pés em terreno hostil a ele, grande demais para ser compreendido e devidamente explorado. A tentativa, em si, é louvável, nos dois casos, mas fica muito claro que os dois diretores não estavam preparados para a empreitada.

No mais, é bem estranho ver Robin Wright e, principalmente, Harvey Keitel (nunca o vi tão deslocado), além de Paul Giammati, em papeis que parecem gritar o tempo todo: "ei, eu devia apenas servir para uma rotocópia, esse diretor não gosta de trabalhar comigo".

Piadas à parte, é mais ou menos essa a impressão que fica no final: se a realidade é insuportável, e é melhor viver no mundo mágico (ainda que também perigoso e imprevisto), para que perder 40 minutos filmando a realidade, da maneira mais destrambelhada possível? Como numa analogia entre um hangar que serve de casa improvisada para Robin Wright, que é atriz e personagem, e expõe sua vida ao drama de forma corajosa (até que ponto tudo aquilo é ficção?), os primeiros 40 minutos servem apenas como trampolim para a segunda parte. Mas quando esta chega, já estamos devidamente enfastiados.

Sérgio Alpendre

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