Ano VII

Somos o Que Somos

terça-feira nov 5, 2013

Somos o Que Somos (We Are What We Are, 2013), de Jim Mickle

Cineasta mais interessante surgido no panorama do cinema de horror nos EUA nestes últimos 10 anos, Jim Mickle é o único desta geração que parece trilhar caminhos que o ligam diretamente a linhagem mais nobre do gênero, ainda em atividade no país. Mais do que qualquer outro, e com certeza bem mais do que um diretor sem talento como Rob Zombie, foi Mickle que com apenas dois longas – Infecção em Nova Iorque (2006) e Anoitecer Violento (2010) – quem fez evocar os nomes de George Romero e John Carpenter com mais vigor. Seja no ambiente urbano do primeiro ou no cenário desolado do coração dos EUA no segundo, a chegada do apocalipse na forma de mutações (homens-ratos ou vampiros) é vista de forma crua e sempre com um discurso pontual.

A sabedoria ao trabalhar com um baixo orçamento, criando personagens verossímeis e que importem ao espectador, é algo que poucos se mostraram capazes neste novo horror estadunidense. Mesmo sem adicionar ao tema proposto nenhuma grande novidade, mantém um frescor raro em meio a tanta bobagem servida. Em Infecção em Nova Iorque, realizado com 60 mil dólares, os moradores de um velho prédio em Manhattan contam apenas com os próprios vizinhos para escapar de uma praga que se alastra através dos ratos e dos humanos contaminados, um novo tipo de peste negra. No filme seguinte, uma infestação de vampiros deixa os EUA sem governo e seus habitantes sem esperança. Esse é o horror do ianque depois do 11/9 e do furacão Katrina.  

Ao que aceitou refilmar o suspense mexicano Somos Lo Que Hay (2010) de Jorge Michel Grau, alterando o roteiro e acrescentando pontos em comum com seus filmes anteriores, Jim Mickle superou o original. Junto com o habitual colaborador Nick Damici (ator e co-roteirista), Mickle transpôs o drama da família de canibais originária da Cidade do México, para uma pequena cidade rural nos arredores de Nova Iorque. Presa a uma tradição religiosa (e canibal) que remete aos tempos dos pais fundadores, o núcleo familiar vai se desintegrando aos poucos, após a morte acidental da mãe e com a estação de chuvas torrenciais que trará à tona os segredos (os esqueletos enterrados das refeições). Tudo isso em uma cidade que oferece poucas oportunidades.

Somos o Que Somos ainda que não consiga manter-se no mesmo nível das obras anteriores de Jim Mickle, é um raro exemplo de qualidade para o gênero em 2013. Pode ser o mais irregular filme dele, mas mantém o seu nome acima dos farsantes que envergonham tudo que o moderno horror dos EUA alcançou. Ponto para Mickle, só que daqui para frente seremos mais exigentes.

Leandro Cesar Caraça

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