Ano VII

O Invasor

sábado dez 15, 2012

O Invasor (2001), de Beto Brant

O terceiro longa-metragem de Beto Brant abalou o começo da década passada no cinema brasileiro como um terremoto, dada sua abordagem temática e estética numa visceral representação dos transes da classe média local.

O primeiro plano do filme é o ponto de vista do mercenário vivido por Paulo Miklos, figura que, até determinado momento, justifica o título O Invasor. Porém, por metade do filme o espectador enxerga o desenrolar dos acontecimentos sob o olhar de dois empresários (Marco Ricca e Alexandre Borges), que contratam um assassino para eliminar o terceiro sócio. A guinada expressiva se dá quando Miklos efetivamente entra em cena – corpo, voz, trejeitos, linguajar, tudo aparece como autêntica invasão, dentro e fora do filme.

Dentro, porque o assassino surge no enredo para incomodar, tumultuar, ocupar um espaço, levando ao desespero os dois homens que o contrataram; fora, porque o público se assusta, se surpreendente, nunca sabe muito bem como lidar com aquele personagem que parece absolutamente deslocado do universo que até então havia sido o centro da ação do filme.

O curto-circuito se potencializa quando surge a filha da vítima, vivida por Mariana Ximenes, paquerada e assediada pelo homem que matou seu pai. Dali em diante, o filme modifica o próprio olhar e passa a atentar para Miklos – sua realidade na periferia, o orgulho de seus iguais, a inserção no “novo mundo” dos ricos (proporcionada pela relação com a garota), a sedução que ele proporciona a todos ao redor, a ideia de que ele parece querer compensar sua marginalidade ocupando, no máximo de despojamento possível, um espaço que a sociedade sempre lhe negou.

Do outro lado, há Marco Ricca, o aspecto consciencioso da dupla que forma com Alexandre Borges. É ele quem sofre a metamorfose de se tornar ele mesmo o verdadeiro invasor – quase sem percebermos, num processo similar ao que se vê nos melhores filmes de Joseph Losey, Ricca passa de dominador a dominado. Ele é tomado pela própria consciência, pela figura do marginal, pela amante, pelo sócio, pela esposa. Esse homem vai surtar, correr sem rumo, desabar diante de um complexo jogo de poder e força para o qual não tem preparo. No fim, torna-se o único invasor de fato, enquanto todos os demais personagens se adequam aos papéis nos quais eles acreditam poderem assumir.

Marcelo Miranda

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