Ano VII

Parte 11: Sobre automóveis e outras jaulas: L e Postcards from the Zoo

sexta-feira nov 2, 2012

Sobre automóveis e outras jaulas: L e Postcards from the Zoo

Típicos produtos de festivais, L e Postcards from the Zoo, cada um à sua maneira (e, em ambos, o apreço ao estilo e à forma tornam seus conteúdos quase acidentais), partem de um contexto sutilmente político para, ao final, reafirmarem a força do indivíduo, mesmo frente a um panorama contrário a ela.

L é mais facilmente reconhecível, fazendo com que essa estranha sinopse de um homem que vive dentro de seu carro – uma espécie de motorista de apenas um cliente, que lhe demanda constantemente pelo melhor mel possível – logo torne-se decodificável àqueles habituados ao estilo deadpan de Jim Jarmusch, ou à filmografia de Elia Suleiman.         

Como é usual nestes cineastas, o grego Babis Makridis conduzirá sua estreia em uma sucessão de esquetes, com apenas um fiapo de desenvolvimento narrativo para uní-los. O que aqui está em jogo, de fato, é a ideia de uma alienação tanto econômica quanto sentimental, materializada na figura deste homem de rosto impassível, que vislumbrará um horizonte no momento em que sua prisão (seu carro) passa de uma realidade primordial a uma situação particular; em primeira instância, com sua ex-mulher e seus filhos e, no pano de fundo, com a crise financeira de seu país.

A detenção do personagem, através da rigidez dos enquadramentos de Makridis, torna este filme esteticamente bonito, mas amargo; só não por demais entediante, pois sempre bem-humorado, ainda que bastante repetitivo.

Mais surpreendente e arriscado é Postcards from the Zoo, o que não se traduz em um trabalho melhor: não o é, em absoluto. Seu início é promissor, quando esse relato evasivo de uma garota abandonada em um zoológico, na Indonésia, joga o espectador em um terreno entre o documental infantil e o fantástico.

A analogia entre os habitantes à margem da sociedade (que passam suas noites neste local artificial por definição, o zoológico) e os animais, fora de seu habitat natural, no entanto, vai perdendo força à medida que Edwin (o diretor desta produção, indicada ao último Urso de Ouro, em Berlim) tenta, de fato, contar uma história, culminando no instante de cognição da maturidade de sua personagem.

Ainda mais problemática é a equiparação que daí surtirá quando a vemos exposta aos olhos lascivos dos clientes de um prostíbulo, onde ela, por força das situações e de sua inexperiência de vida, acabara trabalhando. Como as espécies em cativeiro (que ela cresceu amando e admirando), estas meninas são apresentadas (e vendidas) por suas supostas particularidades, no caso, sexuais.

A porrada final, neste percurso do lúdico à crueza da realidade – que até então só era sugerida pelos barulhos da metrópole invadindo o zoológico – atinge coisa nenhuma, e as vontades de provocar e, ainda mais latente, de resultar-se em algo além de excêntrico (pois sua conclusão visa emocionar), nunca são de todo concretizadas. Pelo contrário, vemos uma realização calculada a ponto de aprisionar-se em suas próprias aspirações. 

Bruno Cursini

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