Ano VII

Diário – Parte 1: Algumas sugestões

sábado out 20, 2012

Diário da Mostra – Parte 1

Nesta primeira parte do diário, algumas indicações para o espectador de primeira viagem (correndo o risco de ter esquecido filmes importantes, risco que poderá ser corrigido em partes futuras, e tirando os brasileiros, que não posso recomendar no momento por participar de um júri).

 

IMPERDÍVEIS

O Gebo e a Sombra, de Manoel de Oliveira

Não vi ainda este novo filme de Oliveira, e não verei na cabine de imprensa por consideração ao mestre (como ver mais filmes depois do dele?). O mais fraco que ele realizou neste século (Cristóvão Colombo: Ontem como Hoje) é imperdível. É quase impossível que esse não seja. O diretor passou dos cem anos, mas continua com uma lucidez invejável.

A Bela Que Dorme, de Marco Bellocchio

Amigos críticos que já viram contam maravilhas deste novo Bellocchio. Convém programar, apesar de já estar comprado para exibição comercial no Brasil.

Coronel Blimp – Vida e Morte , de Michael Powell e Emeric Pressburger

Durante muito tempo este filme de 1943 foi o meu preferido de Michael Powell (até que algumas revisões recentes me fizeram balançar entre ele e Narciso Negro e Sapatinhos Vermelhos. Hora do desempate? Passa em cópia restaurada e integral, com mais de duas horas e meia.

Outrage: Beyond, de Takeshi Kitano

Kitano realiza uma continuação do filme que o fez voltar à boa forma. Foi mal programado, e por isso exigirá certo sacrifício (ver a sessão da meia-noite, por exemplo).

Um Alguém Apaixonado, de Abbas Kiarostami

As sessões deste filme japonês do grande diretor iraniano acontecem todas na segunda metade da mostra, e deve entrar em cartaz brevemente. Mas é difícil controlar a ansiedade quando se trata de Kiarostami.

Tabu, de Miguel Gomes

Já visto no Festival do Rio, este novo longa de Miguel Gomes tem uma beleza indecifrável. O crocodilo, que está no cartaz do filme, nos lembra o adorável cão de As Quatro Voltas, e já entra definitivamente para a galeria de grandes animais do cinema.

Nível Cinco, ambos de Chris Marker

Homenagem ao grande diretor francês (de Sans Soleil), falecido neste ano.

Raros Sonhos Flutuantes, de Eizo Sugawa

Último filme do incompreendido Sugawa, Raros Sonhos Flutuantes é uma obra-prima que transforma O Curioso Caso de Benjamin Button, com o qual tem fortes paralelos, em pó, mesmo para quem gostou da bobagem de David Fincher.

Lawrence da Arábia , de David Lean

Confesso que não tenho o filme mais famoso do bom diretor inglês David Lean em alta conta. Mas não posso dizer que minha opinião é confiável, uma vez que só o vi na TV, em tela cheia. E certamente é do tipo de filme que só faz sentido na telona do cinema.

Tubarão, de Steven Spielberg

Apesar de ser um dos filmes mais importantes da retomada de Hollywood como fábrica de ilusões, sobretudo pela campanha de marketing agressiva, é também, paradoxalmente, um dos filmes mais autorais de Spielberg. É outro clássico que chega em cópia restaurada.

Retrospectiva Andrei Tarkovski

Com a exceção de Nostalgia, todos os longas de Tarkovski vieram em cópias 35 mm impecáveis e raras. É do tipo de retrospectiva que justifica uma viagem a São Paulo (para quem é de fora). Quem viu O Sacrifício nesta sexta no Cinesesc saiu embasbacado com a qualidade da cópia.

Retrospectiva Minoru Shibuya

Está sendo vendido como assistente de Ozu, o que é natural, mas Shibuya trabalhou mais com Mikio Naruse e, principalmente, Heinosuke Gosho. Com estes dois aprendeu a burilar seu estilo, contando histórias de pessoas comuns. Dos sete filmes programados, faça o possível para ver, nesta ordem: Retidão, Os Passarinhos e O Rabanete e a Cenoura.

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CONVÉM ARRISCAR

Estudante, de Darezhan Omirbayev

Na virada do século 20 para este, Omirbayev tinha presença constante na Mostra, quase sempre com filmes bem respeitáveis. Convém verificar como está esse antigo queridinho da crítica.

O Resto do Mundo e A Riqueza do Lobo, ambos de Damien Odoul

Seria Odoul um Pasolini com defeito? Ou um polemista de certo talento? Não sou entusiasta do que já pude ver de seu trabalho (Alento e A História de Richard O.), mas seu cinema me interessa mais do que o de Bruno Dumont.

O Rio, de Ryuchi Hiroki

O japonês Hiroki apareceu na mostra Japão Pop, realizada no CCBB anos atrás, com dois bons filmes: Vibrator e It's Only Talk.

No, Post Morten e Tony Manero, três longas de Pablo Larrain

Ainda não vi No, e Tony Manero é apenas razoável, mas Post Morten faz com que Larrain seja um diretor a ser acompanhado com certo interesse. Uma boa oportunidade para conhecer sua obra é esta mini retrospectiva com três de seus quatro longas-metragens.

38 Testemunhas, de Lucas Belvaux

Talvez devesse entrar nos imperdíveis (a ser confirmado quando finalmente visto) este novo suspense do diretor do ótimo O Sequestro de um Herói.

La Noche de Enfrente, de Raoul Ruiz

Ruiz já realizou tanto obras-primas quanto filmes descartáveis. Este seu derradeiro trabalho foi recebido com pouco entusiasmo.

Après Mai, de Olivier Assayas

Outro diretor irregular, mas que é sempre bom acompanhar.

Além das Montanhas, de Cristian Mungiu

Agora que a moda do cinema romeno felizmente passou, podemos verificar o que sobrou dos que já nos mostraram bons filmes.

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Uma recomendação extra: filme que chega celebrado pela imprensa que cobre festivais internacionais não é obrigatoriamente bom. Muitas vezes é o contrário, o retrato do convervadorismo estético que tanto engana jornalistas festeiros, admiradores de mensagens ou cinéfilos que gostam de tudo. Um exemplo perfeito dessa celebração desmedida é Minha Felicidade, a mediocridade completa de Sergei Loznitsa. Outro é Las Acacias, que é pouco mais do que medíocre, mas não vai longe. Em cada edição há sempre de cinco a dez filmes que chegam com elogios muito exagerados de fora, portanto, convém moderar as expectativas.

Uma preocupação: De um filme visto hoje, Jards, cópia belíssima em digital no Frei Caneca. Mas em scope, com créditos cortados por causa do zoom irresponsável do projecionista. Eryk Rocha estava na sessão. Teria ele endossado tamanho equívoco? Sobre o filme em si não poderei comentar por problemas éticos (faço parte do juri do Itamaraty, que premiará dois filmes brasileiros no final da edição).

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Encerrando esta primeira parte do diário, convém lembrar que a organização da Mostra prometeu que não vai haver cópias digitais abaixo da crítica. Ou seja, a Mostra promete voltar a ser o que era nos anos 1990: o principal evento cinematográfico do Brasil.

Sérgio Alpendre

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