Ano VII

O Abrigo

quarta-feira jul 18, 2012

O Abrigo (Take Shelter, 2011), de Jeff Nichols

Está longe de ser um grande filme, mas O Abrigo, de Jeff Nichols,  tem angariado elogios por onde quer que tenha passado. Estreou em diversos países, mas a filial brasileira da Sony deve achar que o público brasileiro é estúpido e lançou direto para DVD.

Um dos poucos textos negativos que li foi o de Luis Miguel Oliveira, ótimo crítico português. Ele reclama das nuvens artificiais, muito bem feitas no computador, e formula uma bela e certeira teoria: "quanto mais fácil for fazer filmes, mais difícil será fazê-los especiais". Oliveira acerta no alvo, já que é inegável que a facilidade tem tornado tudo muito raso, e o grande cinema é cada vez mais exceção. Lembra o que dizia Buñuel sobre a dificuldade que tinha na juventude para escutar música. Dizia que antes ele sabia que uma orquestra iria tocar na cidade vizinha e ficava contando os dias, com tamanha expectativa. Depois, era só apertar um botão para se ter toda a música que desejar (imagine se ele conhecesse o tempo atual do download). O diretor de O Fantasma da Liberdade formulou então uma outra teoria, igualmente implacável: "para se ter toda a beleza, três coisas são fundamentais: esperança, luta e conquista".

Digressões à parte, é necessário dizer que as nuvens de O Abrigo, por mais que se concorde com o crítico português, precisavam ser feitas artificialmente. Não há como esperar a natureza para uma tempestade como a que acontece no filme. É irreal, como um monstro de filme de horror. E não podemos esperar que surja um monstro da natureza. A cara assustadora de homem que aparece no ponto em que o acúmulo de nuvens parece tocar o solo, ao longe; o frenesi de descargas elétricas entre elas (algo até alcançável, mas não com o terror conseguido por Nichols), e mesmo o comportamento dos grupos de pássaros que por duas vezes assombram Curtis,  o personagem de Michael Shannon, só poderia ser conseguido em computador (Hitchcock aprovaria).

O que o filme tem de mais interessante, afinal, é justamente a correlação entre a tempestade interior de Curtis e sua luta para domar a esquizofrenia hereditária (sua mãe teve tal diagnóstico quando ainda relativamente jovem). No final, as coisas irão se complicar bastante, já que a correlação passa a ser entre a tempestade que se anuncia e a crise que ameaça o casal. E se estamos diante do apocalipse, um apocalipse em tudo oposto ao que Béla Tarr encenou no espetacular O Cavalo de Turim, ele é sonegado ao espectador, porque deixado para depois dos créditos, que sobem enquanto ouvimos ameaçadores trovões.

Sérgio Alpendre

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