Ano VII

Uma Vida Melhor

sexta-feira abr 13, 2012

Uma Vida Melhor (A Better Life, 2011), de Chris Weitz

Partindo da zavattiniana premissa de um pai, tentando criar seu filho em um ambiente de crise econômica e de sua consequente humilhação moral, Uma Vida Melhor funciona como uma variação do clássico neo-realista de Vittorio De Sica, Ladrões de Bicicleta. Como neste, o protagonista tem seu instrumento essencial de trabalho roubado e, na companhia do filho, parte em busca daquilo que lhe fora retirado.

No esforço em contextualizar o filme em sua época (os dias de hoje) e lugar (a área menos, digamos, cinematográfica e cinematografada de Los Angeles), Chris Weitz concede razoável espaço aos pequenos acontecimentos da rotina de seus personagens. Pegamos, por exemplo, dois momentos distintos: Carlos (Demián Bichir, indicado ao Oscar por este papel) está voltando para casa após um exaustivo trabalho nas mansões da cidade. Ele está sentado no banco de carona da caminhonete que, futuramente, irá lhe pertencer, e que será o elemento que causará, primeiro o seu desespero financeiro (com seu furto) e, posterior e redentoramente, resolidificará sua relação com Luis, seu filho adolescente, na jornada pela busca do veículo.

Passando pelos diferentes bairros da metrópole, olhando desconhecidos e coisas estrangeiras, Carlos distrai-se e não percebe estar em um momento crucial de sua vida. Mexicano, vivendo ilegalmente nos Estados Unidos, recusa-se em retornar a seu país natal, onde o mundo ao seu redor não lhe parecerá tão fascinante e sedutor, não obstante sua dura luta cotidiana, pelo simples sonho da tal “vida melhor”.

No outro instante, estamos com o jovem Luis, ainda pesando os prós e contras de levar uma vida de recompensas mais imediatas, com os marginais das gangues de sua escola (cujas dependências muito lembram aquelas de uma penitenciária). Ele está na casa de sua namorada, e duas pequenas meninas se divertem no karaokê, só não mais do que os adultos ali na sala, felizes em assistirem a essas crianças, ainda satisfeitas com suas condições. Que eles (os adultos) sejam bandidos, não importa a Weitz: seu filme buscará – às custas de  vitimar seus personagens – driblar qualquer forma de dicotomia.

Estes são dos poucos momentos, no entanto, em que Uma Vida Melhor mais se aproxima de um trabalho bem realizado. São neles que os artifícios e as manhas do projeto parecem apaziguados; afinal, para que um material dessa natureza (“humana”, “caridosa”, “bem-intencionada”) não resulte, no mínimo, morno (como é o caso daqui), os mecanismos do roteiro devem-se fazer particularmente imperceptíveis.

Vejamos os irmãos Dardenne como um bom exemplo: seus dramas normalmente partem de uma análise da sociedade através das relações profissionais, e é daí que surge o elemento comovente de seus filmes, quando os protagonistas encontram-se no limiar de uma nova ordem social e/ou afetiva.

Até aí, certo. Uma Vida Melhor (bem ou mal) cumpre essas “normas”. Mas o que torna os cineastas belgas eficazes (além desta aparente integridade), são seus roteiros cuidadosamente planejados. Pegamos A Promessa, seu primeiro sucesso em festivais e, até hoje, entre suas melhores obras: também lidando com o tema da imigração ilegal, temos um garoto que ajuda seu pai a trazer, à Bélgica, pessoas sem permissão para ali viverem.

O dilema moral se agravará no terceiro ato, quando o rapaz deverá optar por permanecer-se fiel a seu pai, ou a cumprir uma promessa feita para o imigrante, por cuja morte o garoto sente-se responsável.

Em Uma Vida Melhor, o cineasta opta por trazer, à história, uma série de subtramas e reviravoltas (Carlos recebendo dinheiro emprestado da irmã; o amigo de Luis o atraindo para o mundo da criminalidade; o homem que furtou o veículo sendo encontrado; a própria recuperação da caminhonete), culminando com uma arrastada e
desnecessária conclusão, como se apenas agora (com pai e filho refortalecendo seus laços afetivos) a eventual separação entre eles fosse digna de nossa pena.

Diferentemente dos prestigiados irmãos, ou da antiga dupla Zavattini e De Sica, Weitz dilui, ao invés de acumular, as tensões e os aflitos de seus personagens. Tal atitude se dê, talvez, pelo medo de não conseguir segurar seus espectadores com uma condução mais simples ou, ainda, por estar demais preocupado em realizar planos com grua e arrancar lágrimas à força, mesmo após o verdadeiro conflito de sua história já ter sido claramente resolvido.

Bruno Cursini

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