Ano VII

Compramos um Zoológico

segunda-feira jan 2, 2012

Compramos um Zoológico (We Bought a Zoo, 2011), de Cameron Crowe

Compramos um Zoológico é Cameron Crowe fazendo um filme para as férias (pergunta: alguma vez o diretor fez algum filme que não pudesse ser “para as férias”?). Assim, todos os membros das difundidas famílias de propagandas de margarina  poderão encontrar aqui seus correspondentes diretos: a menina simpática, o adolescente rebelde, a garota apaixonada, a jovem engajada, o pai perseverante, a mãe amorosa. Seria a família americana por excelência, caso Crowe não optasse por fraturá-la para, assim, poder trabalhar com um de seus mais recorrentes temas: o luto.

O roteiro parte de um lugar-comum: após a morte prematura de sua esposa, Benjamin (Matt Damon) vê sua vida profissional ameaçada, ao mesmo tempo em que seu filho mais velho apresenta dificuldades no colégio. Para realinhar sua vida e, se possível, apagar um pouco a lembrança de sua amada mulher, sai atrás de uma nova casa, em algum outro bairro da cidade. Ao encontrá-la, um porém: com ela, vem um zoológico desativado, mantido por um grupo de poucos funcionários, entre eles, Kelly (Scarlett Johansson) e Lily (Elle Fanning).

Se boa parte das produções hollywoodianas adotam como única e exclusiva preocupação a manutenção da estrutura familiar, em filmes como este, feitos na medida para o Natal, tal atenção torna-se sua própria fundamentação, o que – compreensivamente – irá afastar alguns espectadores (e chamar outros tantos, e é essa, afinal, sua razão de ser). Entretanto, Crowe consegue maquiar alguns automatismos do roteiro através de uma qualidade que podemos encontrar, em níveis variados, em toda sua inofensiva filmografia (com a ingrata exceção de Vanilla Sky), uma propriedade não das mais abundantes no cinema, uma certa franqueza e sobriedade apaixonada, aqui reforçada pela figura insuspeita de Matt Damon: tirado o circo ao seu redor, Compramos um Zoológico é sobre a convalescença de sua personagem, materializada em sua relação com seu filho adolescente.

Todo o cinema de Cameron Crowe parece resumido naquela que é certamente a imagem mais reveladora de sua carreira, aquela que, lá pelas tantas em Digam o Que Quiserem, nos mostra John Cusack em uma desconsolada serenata, com um grande rádio portátil segurado por cima de sua cabeça. Temos ali a música popular, o homem beirando o desespero, a compaixão, a generosidade e, sobretudo, um confronto a qualquer cinismo. Neste contexto, pode-se afirmar que o cineasta é uma espécie de Bruce Springsteen pop, sem os personagens marginalizados e as narrativas desmitificadoras do american way of life do compositor de Born to Run: sai a desilusão com o sonho americano, ficam os carros, as estradas, as garotas, enfim, a esperança e o entusiasmo. Se isso tem qualquer coisa de verdade, Compramos um Zoológico é seu Lucky Town: agradável, ainda que por momento algum totalmente satisfatório (pergunta: alguma vez o diretor fez algum filme que pudesse ser considerado “totalmente satisfatório”?).

Bruno Cursini

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