Ano VII

John Wick 2

sexta-feira fev 24, 2017

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John Wick 2 – Um Novo Dia Para Matar  (John Wick: Chapter 2, 2017), de Chad Stahelski

A ideia de herói solitário se faz ver logo no título que, para ser mais apropriado, poderia estampar um “versus”, como nas melhores traduções de longas de James Bond. John Wick Contra O Mundo viria bem a calhar para essa segunda jornada do herói mascarado (a máscara do herói sem expressão, como a de Ryan O´Neal em The Driver) vivido por Keanu Reeves.

Dois dos caprichados set-pieces são estruturados de maneira semelhante: Wick caminha por determinado espaço e as mais diversas pessoas ao redor recebem ligações ou mensagens avisando-lhes sobre a recompensa pela cabeça do herói. Passam então a lhe atacar sem qualquer estratégia visível, o que dá a oportunidade de Wick atravessar os perigos quase como em um filme de zumbi: sempre em movimento, disparando à queima roupa. De fato, o personagem vive em um mundo de simulacro, em que qualquer personagem é ameaça, ao mesmo tempo em que nada é, de fato, ameaçador. Figurantes, soldados menores, como em um super sentai, só servem para tirar o herói para dançar e fazê-lo mostrar suas habilidades com o corpo. Nada é de verdade, o hotel, os ternos, as relações contratuais – nem mesmo os mendigos, todos homens em disfarce.

Trata-se, claro, de um simulacro de filme de ação que se despe de tudo o que não seja a própria ação. É um longa de Bond sem mulheres tirando a roupa, sem drinks, sem gigantescas cenas de exposição sobre o vilão, sem a farsa política. Sobra o terno feito sob medida, o carro, os gadgets, também feitos sob medida e a inevitável solidão. Uma das sequências finais, que lembra o clímax de 007 Contra o Homem com a Pistola de Ouro, se passa em uma exposição cercada de espelhos, que multiplicam a imagem de Wick e dos bandidos (aliás, peculiar museu, em que as esculturas greco-romanas têm a base enfeitada com mangueiras de luzes neon, para que brilhem mais, talvez? Para que se tornem mais vistosas? Nem mesmo a solidez das esculturas é mantida; trata-se logo de transformá-las em luz, escolha que se repete em outros momentos, como na perseguição de carro no início, em que a lataria brilhante do Mustang refletem os outdoors da cidade). E, claro, não poderia faltar uma sequência em um palco, com luzes pulsantes e música eletrônica. É a dança da ilusão!

Nesse estranho minimalismo, em que todos os adornos vão sendo eliminados, restando apenas a imagem do herói em movimento, subtraem-se até as balas de revólver. Como escrevi acima, Wick sempre dispara à queima roupa. Chad Stahelski, em geral, tem preferência pelo plano aberto e o que sobra, então, são as coreografias de Reeves, que rola no chão, braço para lá, braço para cá, em um contorcionismo típico de longas de arte marcial. A busca por uma essência do filme de herói solitário e a franqueza de Stahelski em assumir-se como ilusionista, que proporciona um espetáculo de luz e espelhos, faz de John Wick – Um Novo Dia Para Matar (a tradução brasileira é ela mesma um simulacro de títulos de Bond; é praticamente um anagrama de 007 – Um Novo Dia Para Morrer) algo estimulante visualmente. Para o mundo de simulacro, é o bastante.

Wellington Sari

 

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